Gama, 14 de setembro de 2021
Livros de família
Uma editora especializada em transformar histórias familiares em narrativas literárias cresce na pandemia com o desejo de preservar a memória
Por Betina Neves
Você já pensou que a história da sua família daria um livro – ou, pelo menos, uma coletânea dos “causos” contados em almoços de domingo?
O jornalista e escritor André Viana – filho do contista Antônio Carlos Viana – abraçou essa ideia quando, em 2011, foi convidado a transformar em livro a biografia de um empresário paulistano. Ali nascia o que se tornaria a editora Livros de Família, que, de lá para cá, já deu vida a mais de 40 títulos com histórias que viajam passado adentro na vida de centenas de pessoas e que neste ano cresceu com novos integrantes e projetos.
Os livros são encomendados pelas próprias famílias, que vêm de cidades como São Paulo, Salvador, Recife, Curitiba e Rio. “São pessoas que querem registrar o passado e descobrem que tem alguém que faz isso. Às vezes, essas memórias já vêm borbulhando, já que existe uma certa ansiedade em fazer isso antes que as pessoas mais velhas se vão”, conta Viana.
Na pandemia, a procura pelo trabalho da Livros de Família cresceu, junto com a equipe de colaboradores, que hoje conta com oito pessoas, entre estagiários e biógrafos. Entre os adendos deste ano, está a dramaturga, jornalista, roteirista e escritora Marta Goés, que tem no currículo a autobiografia da atriz Fernanda Montenegro.
“Acho que essa relação com o tempo, a morte, a memória e o passado aflorou na pandemia. Muita gente vem nos procurar dizendo que os pais ou os avós estavam em casa sem ter o que fazer na quarentena e veio a vontade de guardar as histórias de vida.” Neste momento, Viana está coordenando dez livros ao mesmo tempo – o processo de produção costuma ser longo, com no mínimo seis meses, mas pode chegar a três anos.
A princípio, André Viana ingressou na empreitada munido do espírito jornalístico de fazer uma documentação fiel do passado. Depois, entendeu que a memória não funciona assim. “Percebi que trabalhamos no campo do mito, das lendas de família. É uma documentação emocional e subjetiva. A realidade é inatingível – o que vale pra gente é o registro que se fez dela”, diz. Às vezes, ele dá com três ou quatro versões da mesma história e precisa deixar isso explícito no livro de alguma forma.
As memórias são encaixadas no contexto histórico da época – este sim, fruto de uma pesquisa atenta aos fatos –, que serve como pano de fundo. “Estamos registrando uma sociedade de outros tempos, um século 20 que já acabou.” Já passaram pelas mãos dele um calhamaço de mais de 500 páginas sobre uma família que fugiu do holocausto, uma saga sobre imigrantes italianos em cinco volumes e a trajetória de um gaúcho criado em uma fazenda que se tornou presidente de uma das maiores empresas do ramo alimentício do país – a editora também se dedica a contar histórias de empresas familiares.
Os livros costumam vir tanto com histórias narradas por uma pessoa só quanto com relatos de vários parentes – André já chegou a entrevistar mais de cem pessoas para um único projeto. “Não existe fórmula, os livros são escritos a partir de como a história é contada. Nem eu, nem a família sabemos que caminho a coisa vai tomar”, conta. Em uma situação, por exemplo, André percebeu que a figura de uma matriarca já falecida era muito impactante para o resto da família e escreveu o livro a partir da perspectiva dela já no túmulo, à lá “Memórias póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis.
O que estava debaixo do tapete
É claro que, ao esquadrinhar o passado das famílias, nem tudo são flores: é comum que situações espinhosas venham à tona nas pesquisas para os livros. Uma mulher que não tinha certeza se é filha do pai ou do avô, um homem que escondia um filho morto de Aids nos anos 1980, um adolescente que desapareceu e nunca teve o corpo encontrado e um patriarca que morreu em um acidente de avião e deixou a família na pindaíba são casos já ouvidos por ele.
“Desde o começo deixamos claro que vamos falar das coisas boas e ruins e que não são livros ‘elogiosos’. Tentamos contar esses casos com delicadeza, sem expor as pessoas, mas também sem esconder que as famílias são tristes e felizes ao mesmo tempo”, diz Viana.
Nesses dez anos tocando o trabalho, Viana percebeu o caráter transformador e até terapêutico que os livros evocam nos envolvidos – momentos catárticos de choro e desabafo são comuns. “As pessoas muitas vezes não têm ideia de como foi a trajetória delas até que elas a contem a um desconhecido. E eu faço perguntas estratégicas para isso.”
Na experiência dele, o resgate das memórias vem com uma carga emocional forte que faz revisitar conceitos, reviver mágoas, reconsiderar narrativas e até incentivar a união e o perdão entre os parentes. Certa vez, ouviu uma situação de infância que tinha pautado toda a relação de uma mulher com a família e que ela nunca tinha contado a ninguém. Ao discuti-la para o livro, a família conseguiu ressignificar o ocorrido e acabou se reunindo pela primeira vez em décadas.
Escrever para não esquecer
Normalmente, a família escolhe quantos exemplares quer imprimir e guarda-os para si. Em outubro, porém, um livro da editora vai ser publicado e vendido em livrarias pela segunda vez (a primeira foi em 2019). “Essa Estranha Mania de Querer Mais” foi escrito por Marta Goés e traz a biografia de Elena, que nasceu no interior da Bahia e teve uma trajetória repleta de impasses, desejos e conquistas que a levou a São Paulo e depois ao Canadá e Estados Unidos (nesses casos, a editora só faz a ponte entre a família e a livraria e não fica com nenhuma porcentagem da venda).
Nos últimos anos, também veio a vontade de escrever histórias de quem não tem verba para encomendar um projeto (que custam a partir de R$ 30 mil). Depois de uma matéria publicada no jornal Estado de São Paulo em 2019, por exemplo, a editora recebeu um registro de um homem que passou a vida em um sanatório para leprosos em Belém e um caderno escrito à mão sobre a a vida de uma mulher que foi boia-fria em São Paulo, os quais planeja publicar.
“Nossa intenção é conhecer o passado para entender o presente, impedir que culturas familiares se dispersem e garantir que as gerações futuras saibam quem foram seus antepassados e de onde elas vêm. Publicar essas histórias é um modo de não esquecer.”
link: https://gamarevista.uol.com.br/cultura/ler-ouvir-ver/livros-de-familia/
Jornal CINFORM, 8 de abril de 2019
SUA VIDA CABE NUM LIVRO?
Por Suyene Correia Santos
Carioca
de nascimento, sergipano de coração, o jornalista e escritor André Viana- filho
do contista Antônio Carlos Viana-, morando em São Paulo, desde 1997, decidiu
investir no mercado editorial, a partir de 2011, depois de acumular experiência
como editor e diretor na Trip. Na época, criou a Jerimum
Biográfico, atualmente Livros de Família, especializada em publicações
produzidas, exclusivamente, para famílias biografadas, com tiragens reduzidas,
onde o objetivo maior é proporcionar às novas gerações de uma determinada
família, o resgate de valores e a construção de uma memória, a partir do
conhecimento de suas origens.
Agora, a Editora Livros de Família,
localizada na Vila Madalena, conta com cerca de 30 livros no seu catálogo e
parte para uma nova empreitada: a venda de um produto no circuito de livrarias.
O primeiro livro vendável será “O Diabo na Casa do Terço” da jornalista mineira
Cássia Miguel, com lançamento previsto para o dia 27 de abril, na Livraria da
Vila, no bairro paulistano de Vila Madalena. Mas Viana esclarece, logo: “a
editora não fica com nenhuma porcentagem sobre a venda. O dinheiro volta
inteiramente para a família como uma forma de recuperar o dinheiro investido na
produção do livro”.
Aliás, assim como a tiragem de um livro
dessa natureza varia muito- já houve cliente que solicitou apenas um exemplar,
mas a média é de algumas dezenas- também os preços para a execução de um
projeto biográfico variam de R$ 30 a 100 mil (sem os custos da gráfica), a
depender da natureza da pesquisa e dos profissionais envolvidos.
Atualmente, ainda são poucas as
editoras no Brasil, que se dedicam a essa vertente literária. Com perfil
similar à Livros de Família há a Memorabília (RJ) e a Artesão de Memórias (PR).
Mas André Viana, que lançou “O Doente” em 2014, pela Cosac Naify e foi
finalista do Prêmio São Paulo de Literatura 2015, é otimista não só com o
futuro da sua modesta editora, como também com o futuro do livro. Um pouco
disso, pode ser conferido na entrevista abaixo, onde Viana também conta como
foi aprimorando sua maneira de abordar os biografados, além de revelar algumas
curiosidades sobre essas publicações tão singulares.
Qual metodologia você utilizou para
escrever “Tchô!”, o primeiro livro da Editora, ligado à família de Zoé Silveira
D’Ávila ? Fale um pouco sobre esse processo de encontros, entrevistas e como é
editar todo esse material num livro prazeroso de se ler.
De modo geral, até hoje, os livros de
família não têm uma metodologia específica. Cada livro é escrito de um jeito.
Quem comanda mesmo é o processo de interação com a família. Dificilmente, a
família sabe, já de saída, que tipo de livro ela quer. Eu também não sei, até
conhecer aquela família mais a fundo. Então, vamos construindo juntos, de
acordo com o que vai aparecendo. É um processo inteiramente orgânico. É por
isso que não existe um livro igual ao outro, nem mesmo o projeto gráfico. Nesse
sentido, a Livros de Família é uma editora artesanal, que traz como resultado
uma pequena joia lapidada especificamente para aquela família.
No caso de Tchô!, feito em 2010/2011,
eu cheguei apenas com minha experiência como jornalista. Achava que tinha que
seguir os manuais de biografias e escrever o livro na terceira pessoa. Precisei
escrever quatro versões do primeiro capítulo até entender que Zoé queria, ele
mesmo, contar a própria história. Quando reverti o que havia escrito para a
primeira pessoa, Zoé leu e disse: “É isso!”. Ali entendi que não adiantava
chegar com fórmulas. Que era preciso sentir o terreno antes de começar a
caminhar.
E é assim até hoje. Zoé já estava com
90 anos, então nossas conversas não duravam mais do que meia hora.
Estabelecemos dois encontros semanais. E assim fomos durante um ano inteiro. As
lembranças da infância estavam todas intactas, mas a certa altura, vi que
muitas histórias da fase adulta precisavam ser completadas com a ajuda de
amigos, conhecidos e parentes. Viajei até uma cidade de Santa Catarina onde ele
fez fama como médico e empresário e passei uma semana entrevistando algumas
pessoas. Depois incorporei as informações coletadas à voz do Zoé, o que faz do
livro Tchô! um mosaico de memórias alheias escrito na primeira pessoa.
Ainda que existam poucas editoras
especializadas nessas histórias familiares no Brasil, a procura vem crescendo
nos últimos anos ? E o interesse dos leitores também?
A procura vem crescendo à medida que a
Livros de Família se torna conhecida, no boca a boca. Uma pessoa conta para
outra, que conta para outra, que me procura e depois conta para uma terceira e,
por aí, vai. Embora eu não soubesse que existia esse nicho editorial quando
criei a editora, há outras pessoas fazendo a mesma coisa. Recentemente, saiu
uma reportagem em O Globo falando sobre essas “biografias afetivas”, termo que
eu não conhecia e que adorei. Ali, você tem um apanhado abrangente sobre esse
nicho. Sobre a tiragem, cada família escolhe a sua. Já teve família que
imprimiu um exemplar só e já teve outra que imprimiu 500 exemplares.
A novidade do momento é o lançamento do
primeiro livro de família que estará à venda. Chama “O Diabo na Casa do Terço”
da jornalista Cássia Miguel Baldauf. Ela reescreveu histórias que desde pequena
ouvia o pai contar sobre personagens reais que passaram pela venda da família, em
Guaranésia, no interior mineiro. É um livro muito saboroso, com histórias que
vão interessar e divertir um público maior do que os parentes. Propus a Cássia
que o livro fosse vendido. Ela topou e o lançamento será agora, no dia 27 de
abril, na Livraria da Vila, na Vila Madalena.
Como você avalia esse nicho dentro do
mercado editorial no Brasil de hoje ? E no exterior, esse mercado tem demanda?
De forma muito simples, até porque
nunca fiz nenhuma pesquisa a esse respeito, é um nicho que vem aparecendo de
forma tímida e gradual. Digo isso pelas reportagens da Livros de Família que
têm saído a esse respeito. Não faço a mínima ideia de como é esse mercado no
exterior. O que sei, é que livrarias e bibliotecas na Espanha e nos Estados
Unidos já me procuraram querendo exemplares desses livros de família.
Quando você é contratado para esmiuçar
a vida familiar de alguém, conta com auxilio de historiadores ? Ou você
mergulha fundo, solitariamente, na pesquisa, tendo que contextualizar essas
histórias com fatos históricos ?
Geralmente, quem pesquisa sou eu ou o
escritor/jornalista que contrato para cuidar de determinado livro. Para mim, na
verdade, é a fase mais divertida do processo: ler sobre História do Brasil e do
mundo pra poder contextualizar as histórias da vida privada. Teve um livro em
especial, sobre uma fazenda aqui do Vale do Paraíba, que me levou a ler sobre
história do Brasil durante nove meses para só, então, começar a pesquisa do
livro propriamente dita. Eu sabia que entraria em contato com informações que
demandariam uma base histórica para entender o contexto. Para a concepção desse
livro, contratei uma historiadora/paleógrafa que me ajudou a ler documentos do
século 17/18 que estavam guardados no arquivo histórico de Taubaté. Descobrimos
preciosidades que mais tarde seriam importantes até para historiadores da USP
que estudam as rotas bandeirantes. Fora essa experiência, no mais das vezes
mergulho sozinho nas pesquisas. É um bom jeito de seguir aprendendo.
Como se dá a participação dos
contratantes na hora de editar o livro? Eles deixam você a vontade para colocar
o que quiser ou interferem no que vai ser publicado ?
A combinação inicial com as famílias
biografadas é de que não haverá tema-tabu durante a fase de entrevistas. Tudo
será abordado, as lembranças boas e as ruins. Com isso, esses livros não deixam
de ser um processo psicanalítico para todos. Muitos temas e situações e mágoas
que haviam sido jogadas para debaixo do tapete são revolvidas com a ajuda de
alguém de fora (no caso, o autor ou autora do livro). Isso feito, eu processo
tudo e tento contar tudo da maneira mais cuidadosa possível. O que acontece
bastante em qualquer família, incluindo a minha e a sua, é que uma história
pode ter mais de uma versão — e aprendi que todas são verdadeiras, afinal de
contas, é a versão que aquela pessoa ouviu, guardou e transmitiu. Não é raro eu
ter que entrar num acordo coletivo para definir que versão vai ser escrita.
Suicídio na família, por exemplo, é um tema que não é raro aparecer. Como
abordar — ou se deve abordar — eu sempre deixo a cargo da família. No fim, a
história é dela, não minha. Talvez seja isso que diferencie as biografias de
família das biografias comuns, já respondendo sua pergunta. Por ser uma
encomenda, acordos devem ser firmados —nem para que a família se sinta exposta
e nem para que eu me transforme num biógrafo chapa branca, que só vai publicar
o trigo e deixar o joio de fora. Mas eu sei que mesmo um Ruy Castro, com toda a
sua autonomia, qualidade e prestígio como biógrafo, toma cuidado com certos
assuntos na hora de escrever. Nada é tabu. Só depende do jeito que se coloca.
Isso é algo inerente ao profissional, independentemente, se o trabalho é uma
encomenda ou não.
Das histórias que você já escreveu,
qual a que mais te emocionou e porquê?
Não posso falar o nome da família, mas
enquanto fazia as entrevistas para um livro, apareceu uma mágoa profunda de uma
filha em relação ao pai. Era uma mágoa que persistia por mais de 40 anos. O
episódio tinha acontecido quando ela tinha 7 anos e determinaria uma distância
silenciosa entre eles ao longo da vida, e a família inteira precisou se
encaixar nesse esquema. Quando ouvi o relato emocionado dela, achei o episódio
tocante e resolvi começar o livro por ele. O texto mexeu com a família inteira
porque era uma ferida exposta. Quem não sabia ficou sabendo, quem sabia
precisou enfrentar fantasmas enterrados. Pai conversou com filha, filha
conversou com mãe, todos choraram, se perdoaram e fizeram as pazes. Fiquei
feliz com o desfecho: não só do livro como da nova relação da família. Agora,
já com alguma experiência, posso dizer que não é incomum esse tipo de
transformação na família depois de ver sua própria história refletida num
livro.
Algum sergipano já te procurou para
esse trabalho ? E se ainda não, teria alguma personalidade daqui que gostaria
de biografar a trajetória familiar?
Já, mas as negociações não foram
adiante. Era para contar a história de um grande empresário. Uma família
sergipana que eu gostaria muito de biografar é a Mangueira Viana.
Hoje, você vive, exclusivamente, de sua
editora ?
Sim, hoje vivo exclusivamente da minha
editora. A Livros de Família está entrando em outra fase agora que é a de
livros vendidos em livraria. Até então, os livros eram feitos apenas para
consumo interno. Mas chegou em minhas mãos o livro escrito pela Cássia Miguel e
achei que ali, tinha algo que podia interessar mais gente. Propus a ela vender
“O Diabo na Casa do Terço” e ela topou. A editora não fica com nenhuma
porcentagem sobre a venda. O dinheiro volta inteiramente para a família como
uma forma de recuperar o que foi investido na produção do livro. Tem um próximo
passo que eu quero dar, mas ainda não sei como, que é fazer livros para
famílias que não têm dinheiro para pagar pela produção, mas gostariam de ver
suas histórias espalhadas por aí. Recebi dois originais recentemente, um do
Pará e outro da Bahia. O primeiro é o relato de uma senhora que passou muitos
anos num hospital de hanseníase. O segundo é o relato de uma senhora que
trabalhou a vida inteira como boia-fria e escreveu sua história de vida a
lápis, num caderno. A filha transcreveu e me mandou. São dois pequenos tesouros
que eu gostaria de oferecer aos leitores. Pode ser através de patrocínio de
alguém ou uma empresa. Pode ser um livro digital. Não sei ainda.
Na sua opinião, qual o futuro da
editoras brasileiras, tendo em vista a realidade econômica do país, atualmente
?
Sobre o futuro das editoras, meu
palpite, que não vale nada, é que as grandes corporações vão cada vez mais dar
lugar a pequenas casas editoriais produzindo livros artesanais, lindos e de
tiragem baixa. Pelo menos no Brasil, que é o um país onde se lê pouco ou quase
nada. Na verdade, é isso o que já está acontecendo. Em resumo, o livro não vai
morrer, as editoras não vão acabar. Tudo muda para continuar igual. É nisso que
acredito. Mas é só um palpite otimista esse.
link: https://entrenoticias.com.br/sua-vida-cabe-num-livro/
André
Viana é jornalista e idealizador da Livros de Família, editora especializada em
biografias familiares. A seguir, ele recomenda 5 obras sobre o tema
Felizes ou não, trágicas, divertidas,
politicamente incorretas ou apenas entediantes, as famílias são cada uma à sua
maneira. Mas todas têm seu valor na construção de quem nos tornamos. Listei
abaixo cinco histórias de famílias pra tia Carmela nenhuma botar defeito.
___
Léxico
familiar
Natalia Ginzburg (Companhia das Letras,
tradução de Homero Freitas de Andrade)
A advertência, no texto de
apresentação, é bem clara: "Neste livro, lugares,
fatos e pessoas são reais. Não inventei nada". Publicado em 1963, quando Natalia
Ginzburg tinha 47 anos, Léxico familiarreconstrói, a partir das lembranças de uma das principais autoras italianas do
século XX, o cotidiano dos Levi, uma família
burguesa de poucos recursos que tinha duas questões incontornáveis aos olhos
regime de Mussolini: era judia e socialista. Com maestria, Ginzburg nos faz
olhar pelo buraco da fechadura de sua intimidade
doméstica pra revelar a tragédia de uma sociedade violentada pelo fascismo. Um
livro sobre afeto e política, em tudo o que essas duas palavras têm de similar
e de contraditório.
___
A
cena interior
Marcel Cohen (Editora 34, tradução de
Samuel Titan Jr.)
Na manhã de 14 de agosto de 1943, o
pequeno Marcel saiu com sua babá Annette para um passeio perto de casa, em
Paris. Na volta, a zeladora do prédio os impediu de subir: os nazistas estavam
naquele exato momento prendendo seus pais. Marcel Cohen tinha 5 anos e meio e
viu, da calçada oposta da rua, toda a família subir no caminhão para ser
deportada. Neste livro tão pungente quanto breve, o escritor judeu de origem
turca reuniu tudo o que lembrava e tudo o que conseguiu pesquisar sobre os oito
membros de sua família — pais, irmã,
avós paternos, tios e uma tia-avó — mortos em Auschwitz. Fatos, gestos, objetos
vão saltando das linhas como se Cohen passasse uma lupa sobre fotos antigas,
nos revelando detalhes cheios de significados de uma família que poderia ter
sido e não foi.
___
O
tempo e o vento
Erico Verissimo
Daqueles livros monumentais que definem
a vida em antes e depois. Difícil não atravessar as mais de 4 mil páginas dessa
saga familiar gaúcha sem criar algum tipo de parentesco afetivo com personagens
como Ana Terra e Pedro Missioneiro, Bibiana e um certo capitão Rodrigo, Luzia e
Bolívar, Alice e Licurgo, Rodrigo e Flora. Erico Verissimo levou 13 anos para escrever
as três partes — O Continente (1949),O Retrato (1951) e O Arquipélago (1962) — dessa obra-prima
que conta a história de sete gerações dos Terra Cambará, tendo como pano de
fundo os conflitos que levaram à formação política e social do Rio Grande do
Sul. Uma providencial árvore genealógica nos conduz mão na mão por essa
aventura literária inesquecível.
___
Laços
Domenico Starnone (Todavia,
tradução de Maurício Santana Dias)
O amor é só "um recipiente no qual
enfiamos tudo", diz a certa altura Vanda, personagem desse pequeno e
contundente romance. Publicado originalmente em 2014, Laços é o primeiro livro do escritor italiano lançado no Brasil. A
tradução literal do título — Lacci — é cadarços,
que surgem na trama como um elemento a amarrar a pequena família composta por
Aldo, Vanda e seus dois filhos, Sandro e Anna. Construído a partir de três
pontos de vista, a maior parte do livro é narrada por Aldo, que relembra a
época em que abandonou mulher e filhos para viver com Lidia, bem mais jovem que
Vanda. Em suas breves páginas, Starnone nos presenteia com uma bela reflexão
sobre casamento, pais e filhos, mágoas e amor, não necessariamente nesta ordem.
___
Lavoura
arcaica
Raduan Nassar
"Só através da família é que cada
um em casa há de aumentar sua existência, é se entregando a ela que cada um em
casa há de sossegar os próprios problemas, é preservando sua união que cada um
em casa há de fruir as mais sublimes recompensas." Difícil pensar em
literatura de família e não lembrar dos sermões proferidos à mesa pelo pai
desse pequeno livro sublime lançado em 1975 e imediatamente alçado à categoria
de clássico. No centro da trama está André, que abandona sua casa para fugir de
um amor incestuoso pela irmã, Ana. Nesse livro lírico, vertiginoso e cheio de
simbolismos, descobrimos que a paixão, segundo Raduan Nassar, também é feita de
tabus e totens familiares. NEXO JORNAL, 16
de março de 2019
link: https://www.nexojornal.com.br/estante/favoritos/2019/5-livros-de-hist%C3%B3rias-de-fam%C3%ADlias-%E2%80%94-tristes-e-felizes
Jornal O ESTADO DE S. PAULO, 3 de março de
2019
Estante da memória
Resgate de histórias de famílias mobiliza editoras e o resultado vai além do livro
Maria Fernanda Rodrigues, O Estado de S. Paulo
André, 10 anos, sabia que
a avó tinha nascido na Romênia e vivido um tempo em Israel antes de chegar ao
Brasil um pouco mais nova que ele, com 9, em 1953 – e não muito mais do que
isso. No livro que ele tem em mãos e mostra orgulhoso na foto abaixo, e que
preenche algumas lacunas da história familiar, ele lê a dedicatória: “Você é
uma das razões para esse livro existir”.
Foi por causa de André e
dos outros cinco netos (de seus dois filhos) que Eveline Alperowitch decidiu abrir os arquivos de seu pai,
guardados desde 1989, quando ele morreu, e remexer em suas lembranças. O
resultado pôde ser lido pela família e alguns poucos amigos em Drora, escrito com a
ajuda da jornalista Ana Tanis e publicado com uma tiragem de 100 exemplares.
“Eu achei bem
impressionante que um parente meu tenha participado de uma guerra tão grande.
Fiquei curioso para saber mais sobre a Primeira Guerra, perguntei para os meus
pais, pesquisei na internet, procurei livros na biblioteca. Vai ser muito legal
quando eu tiver uma aula inteira sobre isso. No final, vou poder falar para a
professora que meu bisavô estava lá”, conta André, o leitor mais entusiasmado
do livro da avó, que mora nos Estados Unidos.
“Era isso que eu queria:
uma possibilidade de continuidade, de conhecimento, de mostrar que teve uma
história antes deles”, diz Eveline. Uma história que ela mesma foi conhecendo
mais profundamente à medida que mergulhava em documentos, cartas, diários e que
transformou o livro também num tributo a seu pai, um sobrevivente de duas
guerras e uma prisão que foi se fechando ao longo da vida e com quem ela pouco
conversou. “Conversa foi uma coisa que nunca existiu com meu pai, e se a gente
tivesse podido conversar minha vida teria sido outra, e nem com os meus
filhos”, conta.
A publicação dessa obra
trouxe, assim, outros ganhos para esta família – para além do registro de fatos
e datas, que foi a ideia inicial. “Aprendi a conhecer a minha mãe. Todas as
características de personalidade dela são consequências do período que ela
narrou no livro. E acabei me conhecendo melhor através dos olhos dela e de suas
memórias – algo que não aconteceria se não fosse por um livro como esse. Mais
do que os fatos, o que ficou foram essas explicações de quem somos nós”, avalia
Fernando Alperowitch, 44 anos, filho mais novo de Eveline e pai de André.
“Um pai que eu não tive,
uma filha que meu pai não teve, filhos que eu não tive, netos… todos se
conectaram por causa desse livro. Nós nos apresentamos, quatro gerações de uma
família que está mais próxima hoje”, diz Eveline, psicanalista, para quem o
processo de feitura da obra não foi fácil. “Se não fosse pela Ana e por sua
presença eu não iria me aventurar sozinha. Eu me perguntava: por que não
pudemos ver isso antes, em vida? Descobrir em documentos o que ele sofreu… Não
é fácil, mas é bom. Está ok agora, mais confortável para existir.”
Drora foi produzido e publicado
pela Livros de Família,
editora criada pelo jornalista André
Viana em 2011 e que
lançou cerca de 30 títulos sobre personagens e famílias diversas – resultado de
horas e horas de entrevista, edição de texto, pesquisa histórica e de imagem,
montagem de árvore genealógica, etc.
Tudo começou quando ele
foi indicado por um amigo para uma pessoa que queria registrar as histórias que
seu pai, então com 90 anos, contava nos almoços de domingo. Foi um mergulho de
quase um ano e meio na família de Zoé Silveira D’Ávila. “Gostei da brincadeira.
Achei que era um jeito de juntar as duas coisas que eu fazia: o jornalismo e a
literatura (ele é autor de O
Doente, publicado pela Cosac Naify). E tudo foi acontecendo no boca a
boca”, contra André Viana.
O editor explica que a
primeira conversa fica sempre na superfície da história. “À medida que vamos
mergulhando nos assuntos e vou percebendo onde estão os nós, e aí entra a
experiência de ouvinte do jornalista, toco em temas e a poeira começa a ser
remexida. As pessoas se veem obrigadas, e até aliviadas, de poder falar sobre
aquilo.”
Inevitavelmente tem choro
nas conversas, diz. E muitos dos projetos resultam não só no livro, mas num
novo começo para aquela família. Como na história de Eveline e de outras que
tiveram sua trajetória registrada.
Há outras editoras
especializadas nesse tipo de publicação, como a Artesão de Memórias, de Curitiba, e a
Memorabilia, do Rio. É um negócio economicamente viável e que passa ao largo da
atual crise do mercado editorial
tradicional. Os valores variam. Os projetos mais simples custam, na Livros de Família,
entre R$ 30 mil e R$ 40 mil, fora os custos de impressão (que depende da
tiragem). Os mais trabalhosos podem chegar a R$ 100 mil, também sem a gráfica,
que é mais ou menos o preço de um livro empresarial, explica André.
Biografias de empresas e
empresários também estão na mira do editor, que se prepara para experimentar o
modelo de venda com um de seus títulos: O
Diabo na Casa do Terço, com histórias que a jornalista Cássia Miguel Baldauf ouvia do pai, Jorge Miguel, em sua
venda, na cidade mineira de Guaranésia.
E por que vender?
“Vivemos muito globalizados, estimulados demais por problemas externos,
informados demais. Um olhar e um registro de vivências, valorizando a
simplicidade, a densidade próxima de todo dia pode sim ser literatura. O editor André Viana enxergou isso e me convenceu de que o
livro poderia interessar a quem não conheceu meu pai, nossa venda, as
personagens, a cidade”, explica Cássia.
Investigar as raízes,
conhecer o passado para entender o presente. Perpetuar as histórias. Lidar com
a angústia de que essas histórias possam ir embora com as pessoas. Não
esquecer. Deixar um legado para as próximas gerações. É possível fazer isso
tudo profissionalmente ou de forma caseira.
Foram lançados
recentemente, pela Sextante, dois livros da holandesa Elma van Vliet: Mãe, Me Conta a Sua
HIstória? e Vó, Me Conta a Sua HIstória?
Livro é modo de dizer. Eles são, na verdade, cadernos de perguntas que
propõem um diálogo mais íntimo entre as famílias.
Quando sua mãe ficou
muito doente, ela percebeu que não sabia muita coisa sobre ela. “São momentos
como esse, quando recebemos uma má notícia ou temos um bebê, que nos damos
conta do que realmente importa”, diz a autora ao Estado. Ela então
criou essas perguntas, sua mãe respondeu e segue firme e forte, e uma nova
relação se estabeleceu. “Com o livro, começamos uma conversa totalmente
diferente. Eu me toquei de que ela também tinha sido uma criança, com suas
esperanças e sonhos. Há coisas que não sabemos como nem quando perguntar, e uma
conversa dessa não se encaixa no nosso dia a dia. Além disso, nesse mundo e
tempo em que vivemos esquecemos como passar adiante as histórias de nossa
família. E é tão importante que a gente as tenha”, comenta.
Um amigo sugeriu que ela
publicasse suas perguntas em livro. E então uma menina escreveu para ela
dizendo que era tudo muito legal, mas que sua mãe não tinha sido uma boa mãe –
e que o pai era seu herói. Assim começou sua série que conta hoje com 40 livros
e jogos para famílias e 4 milhões de unidades vendidas. Para Elma, a demanda e
o sucesso de obras como essas vêm da nossa necessidade de nos conectarmos com
as pessoas que são mais importantes em nossa vida.
Memória e ficção. Uma das principais escritoras brasileiras (embora filha de
italianos nascida na Eritreia), Marina Colasanti é adepta dos diários
(“eventuários”, em suas palavras), já escreveu um livro de memórias, Minha
Guerra Alheia, sobre seus primeiros anos e sobre como é ser criança na guerra,
e trabalha num segundo volume centrado em Gabriella Besanzoni Lage, Henrique
Lage e na casa que ele construiu para ela e onde Marina morou por vários anos,
o Parque Lage (que aparece ainda em Eu Sozinha, seu livro de estreia relançado
agora).
Para ela, escrita é
memória. “Nem sempre de fatos, mas sempre de vivências, cheiros, olhares,
sentimentos, sons que acumulamos ao longo da vida e aos quais fazemos recurso
na hora de escrever”, afirma. “O registro da memória é importantíssimo.
Para a construção da história. Para que o passado, sobre o qual se apoia o
presente, não desapareça. Para melhor entender o presente. Para mais amplo
conhecimento do percurso de uma família, de uma sociedade, de uma cultura.”
link: https://cultura.estadao.com.br/noticias/literatura,resgate-de-historias-de-familias-mobiliza-editoras-e-o-resultado-vai-alem-do-livro,70002741378
Revista
HEBRAICA, setembro de 2018
Histórias para famílias
O jornalista André Viana deixou o dia a
dia do jornalismo para ser editor e fundou a JB, isto é, Jerimum Biográfico,
cujos lançamentos não vão para as livrarias, mas ficam ao restrito círculo das
famílias e dos amigos delas. A ideia é imortalizar as histórias de famílias em
livro, e a editora faz de tudo: entrevista familiares, se for o caso pesquisa
jornais e revistas, viaja (se necessário), procura iconografia, edita etc., e
depois entrega a tiragem total para quem o encomendou. André transformou a saga
de uma família italiana a partir de 1870 em um cartapácio de 5 volumes e fio
condutor da história da imigração italiana para o Brasil desde a segunda metade
do século 19. Outro, a pedido de conhecida família paulistana, virou um único
exemplar guardado como uma espécie de relíquia. “É que eles queriam um trabalho
muito discreto”, explica o editor. Mais recentemente concluíram um livro a
respeito da família de Eveline Alperowitch, de origem romena, durante a Segunda
Guerra Mundial. (Bernardo Lerer)
Revista PEQUENAS EMPRESAS GRANDES
NEGÓCIOS, agosto de 2018
O contador de histórias
Registrar
em livros as memórias de uma família é a especialidade da Jerimum Biográfico,
empresa criada pelo escritor André Viana
Por Mônica
Kato
Quem não tem um pai, um avô ou uma tia
animada que adora contar "causos" durante os almoços de família? Foi
para resgatar histórias da vida privada que o jornalista e escritor carioca
André Viana, 43 anos, criou a Jerimum Biográfico, focada em biografias de
família. Os volumes lançados pela JB não vão parar nas prateleiras das
livrarias — em vez disso, são feitos sob encomenda e compartilhados apenas
entre parentes próximos.
A ideia surgiu em 2011, quando Viana,
autor do livro O Doente (Cosac
Naify), foi convidado a escrever a biografia de um empresário gaúcho, à época
com 90 anos. "A família me pediu para reunir as histórias que o patriarca
contava nos almoços de domingo, para passar aos netos e bisnetos", diz.
Foram meses de entrevista, que resultaram no primeiro livro nesse formato.
"Percebi que tinha adorado fazer o trabalho. A partir dali, não parei
mais."
O tempo dedicado a cada livro varia de
acordo com a complexidade da história e o volume de entrevistas. "Um
projeto pode levar de quatro meses a dois anos", diz o autor. A encomenda
mais complexa que já recebeu foi uma série de cinco volumes retratando
diferentes gerações de uma família italiana — foram mais de 50 entrevistados. O
valor também oscila — pode custar de R$ 10 mil (para editar um material já
escrito por alguém da família) a R$ 100 mil ou mais. O trabalho, em geral,
consiste em pesquisa, inclusive a iconográfica (fotos, documentos, cartas),
entrevistas, texto, projeto gráfico e acompanhamento da impressão. O orçamento
gráfico é cobrado à parte.
No
momento, Viana tem quatro livros em andamento. A divulgação não é simples, uma
vez que a maioria dos contratantes pede discrição — muitos clientes vêm do boca
a boca, ou do site do escritor. "Não tenho grandes ambições. Quero apenas
produzir mais livros, em um espaço físico maior, e trabalhar com gente legal.
E, com o tempo, quero tornar os projetos multimídia", afirma.
JORNAL
DA CIDADE, Sergipe, janeiro de 2016
Jerimum Biográfico apresenta histórias de famílias
Já imaginou a história da sua família
ocupando páginas e páginas de um livro, num registro em capítulos, cuja
narrativa pode ser inspirada em grandes sucessos da literatura brasileira ou no
jeito próprio de querer contar a própria estória? Essa foi a sacada do
jornalista André Viana que — filho do escritor sergipano Antônio Carlos Viana —
tem o domínio da palavra escrita, a sensibilidade de ouvir o outro e passar
para o papel uma história de família, deu cria à Jerimum Biográfico, uma
editora de publicações não comerciais para guardar a história familiar, seja
num cofre ou estante particular.
Atraído pelos perfis e histórias de
vida quando da atividade jornalística desempenhada desde 1997, André Viana encontrou numa
oportunidade que bateu à sua porta a concretização de um negócio, dos bons. “Em 2011, eu havia acabado de
pedir demissão da editora Trip, onde trabalhava desde 2004, quando uma amiga do fundador da Trip, Paulo Lima, pediu a ele a
indicação de um jornalista para escrever
a história do pai dela, um empresário gaúcho do ramo alimentício. Paulo Lima
indicou meu nome. A ideia da família
não era um livro para ser comercializado. Os filhos queriam reunir as lembranças do pai, então com 90 anos,
para que as futuras gerações da família conhecessem a história do patriarca. O livro ficou pronto em
meados de 2012 e teve 150 exemplares impressos. Tanto o processo como o resultado final deixaram todos (eu incluído!) muito
felizes. Percebi que havia aí um nicho
de mercado a ser explorado: livros de família por encomenda. Foi quando resolvi
tentar fazer disso um caminho
profissional”, conta.
E está dando certo. Hoje, a Jerimum
Biográfico conta com 11 publicações e duas em processo de construção, tendo cada uma a sua peculiaridade, fazendo o
jornalista escritor mergulhar na vida dos
personagens, sem invasões entre o dito e o não dito. “Cada família é única
a seu modo, na alegria e na tristeza,
na saúde e na doença. Como eu também sou uma peça no tabuleiro da minha própria
família, eu me identifico muito com
as entrelinhas que existem em toda relação familiar. O não dito é tão importante quanto o dito. Tento colher
histórias procurando sempre tomar cuidado para não me tornar um invasor da
intimidade alheia. Esse talvez seja o maior desafio do meu trabalho”, afirmou o
jornalista.
Sobre o processo de construção de cada
história, André Viana explica que o tempo dedicado a cada livro depende muito
do desejo e objetivo de quem encomenda o livro de família, sendo necessário, muitas
das vezes, percorrer o país, e contar com o apoio de familiares para resgate de
lembranças, seja em depoimentos ou registros fotográficos. “Cada livro exige,
em média, de seis meses a um ano de trabalho. Tudo depende, obviamente, do
tamanho projeto e, sobretudo, do tamanho da família. "De uma forma ou de outra, eu participo de
todas as fases do processo: da captação de informações (entrevistas, pesquisas)
à redação final. Não é raro eu viajar para entrevistar parentes que vivem em outros
estados. Agora mesmo estou fazendo o livro de uma família tradicional de Salvador.
Isso tem me levado à capital baiana nos últimos meses. Em relação às
fotografias, oriento os membros da família a vasculharem seus álbuns e caixas
em busca de fotos que consideram importantes para o livro. Num segundo momento,
fazemos juntos uma edição das imagens mais interessantes, do ponto de vista não
apenas narrativo, mas estético”, destacou.
Na confecção dos livros de família por
encomenda, André Viana busca inspirações nas narrativas de cada publicação e
demonstra empolgação de sobra para se alimentar de toda a informação necessária
à construção de capítulos. “A diferença entre um perfil jornalístico e um livro
de família está na extensão do texto e na consequente possibilidade de
aprofundar certos temas. Isso é muito motivador. Quando inicio o processo de um
livro, nunca sei como será o texto. A narrativa vai sendo construída na minha
cabeça à medida que vou entrando em contato com a história e seus personagens.
O fato de não serem livros comercializados — não se submetendo, portanto, às
normas do mercado editorial — tem me proporcionado uma grande liberdade de explorar
formas narrativas. Já escrevi livro, por exemplo, em que a voz narrativa segue
a linha de Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis: a matriarca da
família já morta é quem conta a história. Antes de começar a escrever, obviamente,
submeto minha ideia à aprovação da família. Outros livros são verdadeiros
romances à Gabriel Garcia Marquez, com uma infinidade de personagens e
histórias. Até aqui tem dado certo”, contou.
E
na experiência de ouvir e contar histórias familiares, o escritor revela
curiosidades que agora fazem parte do seu trabalho. “São muitas, A todo instante.
Destaco três: uma é a saga de imigração italiana em cinco volumes. Compus uma
espécie de mini O Tempo e o Vento, que começa em 1870 e vai até os dias de
hoje. Foram quase 100 entrevistados, muitas viagens, muita pesquisa. Um
trabalho gratificante que levei um ano e meio para concluir. Outra curiosidade
foi um livro de exemplar único que fiz para uma família poderosa de São Paulo.
Eles queriam um trabalho tão discreto que imprimiram apenas uma cópia, guardada
hoje num cofre. O terceiro destaque foi um livro sobre uma fazenda histórica do
Vale do Paraíba paulista que escrevi agora em 2015. Precisei passar oito meses apenas
lendo livros de História do Brasil para só então, devidamente abastecido com
algum conhecimento histórico, começar a pesquisa sobre os proprietários da
fazenda de 1650 até hoje”, disse.
Revista THE PRESIDENT, dezembro de 2015
Livros de família
Pequenas tiragens, público restrito e
resgate de tradições familiares. Assim o jornalista e escritor André Viana define
as atividades da editora Jerimum Biográfico. "Em 2011, fui convidado pelo
médico gaúcho Zoé Silveira d'Ávila, ex-presidente da Sadia, com 90 anos, para
fazer um registro da sua história de vida", conta. O resultado foi o livroTchô. A editora lançou outras dez
obras e cada uma delas levou de seis meses a um ano para ser concluída.
"Já produzi um exemplar único sobre um empresário brasileiro. Como Gay
Talese fez naquele famoso perfil de Frank Sinatra, entrevistei parentes e
amigos sem que o biografado soubesse da minha existência", revela. Segundo
Viana, o livro, encomendado pelas filhas, foi entregue ao empresário no dia de
seu aniversário. A mistura de jornalismo com literatura acertou em cheio no
alvo: ajudar grandes famílias a resgatar o seu passado."
PODER, Joyce Pascowitch, julho de 2015
LOMBADA
Imortalizar as histórias familiares em
formato de romance. Essa é a proposta da Jerimum Biográfico, minieditora
voltada apenas para atender a famílias. Desde 2011, quando foi fundada, já
foram 11 publicações. Entre os que já procuraram os serviços da JB estão
milionários, publicitário e outros empresários de destaque do país.